sexta-feira, 4 de março de 2011

Opinião: Leonardo Mendes Jr.

Jogo mental Do Jornal GAZETA DO POVO

Publicado em 04/03/2011 | LEONARDOJ@GAZETADOPOVO.COM.BR

"De todas as mexidas promovidas pelo Ivo, a que mais me agradou – e surpreendeu – foi a entrada do Roger. Agradou porque vi o garoto jogar no Bra­­si­­leiro Sub-20 e fiquei com ótima impressão. Alia a estatura elevada a uma boa movimentação, sabe se colocar, chuta bem. Podem dizer que Roger é novo, que pode sentir a pressão. Não está errado, mas discordo. Roger precisa se colocar acima disso. É a chance que ele tem, precisa aproveitar. Se for bem hoje, joga o Atletiba do­­min­­go, sua estreia no Couto. Quer motivação maior?”

Escrevi essas linhas no dia 28 de janeiro de 2009, no blog Ar­­qui­­bancada Virtual, dentro do site da Gazeta do Povo. Roger havia se destacado pouco antes, no time sub-20. Era a bola da vez naquele momento. Teve algumas chances, acabou engolido pela coleção de lambanças do Coritiba no ano do centenário. Perdeu espaço, rodou por outros times e encerrou sua história de forma melancólica: encontrado morto, sozinho, aos 21 anos, em um quarto de motel.

A morte de Roger deve ser vista além do lamento justificável de parentes e amigos ou das entrelinhas sugeridas pelos manuais de redação. Ela diz muito sobre as cobranças e pressões que o futebol impõe aos seus garotos.

Meninos que desde cedo são identificados pelo ano de lançamento, como se fossem um carro ou uma garrafa de vinho (Roger era “89”). Meninos que logo são precificados – multa para o Bra­­sil, multa para o exterior. Meninos que logo têm suas carreiras e vidas submetidas a ordens de empresários. Meninos que se tornam a única esperança de dar uma vida melhor para famílias numerosas.

Clubes de futebol não estão preparados para ajudar jovens jogadores a suportar esse quadro. Invariavelmente, optam pelo paternalismo guiado por gols e resultados ou simplesmente não fazem nada. Quem faz, sofre com a falta de continuidade do trabalho – assim como acontece nas casas de classe média, se falta dinheiro, corta-se o psicólogo –, o preconceito e a ignorância de dirigentes.

Psicólogo não é motivador. Não é o profissional que vai elaborar um vídeo choroso para exibir antes de um clássico. É quem vai ajudar o jogador a entender as pressões da profissão, a aprender a não ir ao céu com vitórias nem ao inferno com derrotas, a conhecer a si mesmo e o meio que trabalha – e a partir daí ter como cuidar da própria vida, da carreira. É quem deve ter condições de notar que há algo de errado com o jogador e ajudar a evitar que mais uma vida se perca precocemente.

Leia a bula

Antes que os soldados da inquisição acendam suas fogueiras, peço aos leitores o discernimento de ver essa coluna como uma análise de uma situação que é generalizada no futebol. Não estou apontando o dedo para clube algum. Porque o problema poderia ter acontecido com qualquer equipe. E porque tudo já está feito e, infelizmente, não tem volta.

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